Valeu a pena esperar minhas férias pós-mestrado para saborear (literalmente) o livro “Imagens Errantes”, de Carol Garcia, que ganhei há quase dois anos. Afinal, a leitura de férias sem pressa e por isso mesmo mais atenta me permitiu desfrutar dos prazeres de um bom texto. E, definitivamente, as narrativas de Carol merecem.
Resultado da tese de doutorado da autora, o livro “Imagens Errantes” propõe uma abordagem nova e muito interessante sobre os produtos têxteis. Carol Garcia expõe os têxteis como comunicação de moda e os indica como mídia, no seu sentido de funcionar como suporte para as mais diversas mensagens, e pela faculdade das imagens presentes nos produtos têxteis de estabelecer trocas, relações, empréstimos e trânsitos entre sujeitos de diferentes lugares do mundo.
Para além de se constituir como uma referência para o campo da tecnologia têxtil e de estamparia, o livro é uma referência para o campo da comunicação; sobretudo se compreendido o papel e a importância de tecidos e indumentárias estampadas como veículo de comunicação entre nações, povos, países, culturas, grupos. E mais ainda: ao mapear as andanças da estamparia floral e também se constituir como um diário de bordo, recheado de recordações de viagens, a obra se efetiva como importante referência para a criação de moda. Fabuladas em experiências e lembranças de viagens, o estudo sistemático de imagens/padronagens têxteis, se torna mais prazeroso para aqueles que se afligem frente a uma compilação histórico-catalográfica estática.
Mais do que um relato sobre tecidos e estamparias, o livro “Imagens Errantes” se abre como um exercício para as diversas possibilidades de representação propostas nas subjetividades e objetividades das imagens souvenirs, sobre as quais relata a autora.
Senti falta de imagens para ilustrar as ricas passagens didático-poéticas de Carol Garcia – de lugares, passagens, das roupas, lojas, dos tecidos, bazares. Penso que a presença de imagens enriqueceria ainda mais o passeio iconográfico proposto pela autora e seriam providenciais como produtores de sentido. Por um momento, ocorreu-me que Carol, assim como Gustave Flaubert (segundo Alberto Manguel, 2006), tenha se oposto à ideia de imagens acompanharem os textos por considerar que estas poderiam reduzir o universal ao singular, ou que sua bela construção acadêmico-literária pudesse ser devorada por um desenho aquém da qualidade textual. Mas é fato que a ausência das figuras, em momento algum, diminuiu a riqueza do texto e pode, ao contrário, tanto instigar a imaginação quanto estimular o leitor a buscar imagens as quais ler, rejeitar, aceitar, se apropriar… para compor o seu (próprio) repertório iconográfico.
Ressalto as belas exposições/descrições sobre os têxteis e a indumentária indiana e mexicana – sobretudo, as passagens sobre a artista Frida Kahlo –, capazes de despertar até mesmo os “olhares” menos curiosos e atentos à cultura imagética de moda.
Ah, destaque também para lúdicos e metafóricos títulos dos capítulos e para os trabalhos dos “companheiros de viagem” de Carol, que abrem/fecham as divisões do livro e compõem capa e contracapa. Verdadeiros exemplares da prática criativa.
Por Clícia Machado
Consultora da Federação das Indústrias de Minas Gerais
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