Por Maria Alice Rocha
Doutora (PhD) em Design de Moda
A Teoria das Necessidades Humanas, desenvolvida por Maslow (1987), relaciona um conjunto de necessidades que são organizadas em formato hierárquico de prioridade para satisfação, e variável de acordo com os indivíduos. De acordo com essa hierarquia, quando uma necessidade é satisfeita, mesmo que apenas parcialmente, uma nova necessidade é gerada.
A homeostase, ou seja, o esforço automático que o corpo humano trabalha para manter-se constante é o princípio básico de tudo. De acordo com Maslow, essa propriedade de auto-regulação do sistema é o principal motivador para a geração de novas necessidades. Cada vez que uma variável externa tende a modificar o equilíbrio padrão motivacional, faz-se necessária uma nova condição para se sentir satisfeito, e um novo ciclo entra em operação. Portanto, o comportamento de cada indivíduo é usualmente definido por sua necessidade mais urgente.
A teoria de Maslow reconhece cinco necessidades humanas: (1) Fisiológica: associada ao estado de estar vivo, de se alimentar, de sobreviver, etc.; (2) Segurança: associada a tudo que garanta a plena condição de vida, seja contra riscos físicos ou de outra natureza; (3) Social: associada ao amor e ao pertencimento, considerando um contexto social ou tribal; (4) Estima: associada ao reconhecimento individual dentro de um grupo ou tribo e (5) Auto-Realização: associada aos aspectos subjetivos de superação individual.
Partindo da abordagem de Maslow (1987) para o planejamento de produto na indústria do vestuário, da conceituação de qualidade, e relacionando-a com as funções básicas do vestuário definidas por Flügel (1966) – proteção, enfeite e pudor – , têm-se as considerações a seguir.
Na indústria do vestuário, as necessidades fisiológicas podem ser consideradas como uma das funções básicas da roupa: a proteção do corpo, contra a desagradável sensação de frio, e, posteriormente, contra qualquer elemento ou organismo estranho e prejudicial à saúde. À medida que a ciência evoluiu, houve uma mudança em nossas ideias sobre higiene, o que reforçou a possibilidade das roupas promoverem uma crescente proteção.
Sabe-se, no entanto, que no caso brasileiro, há uma predominância do clima tropical e, por conseguinte, não se vê a proteção climática como fator determinante na escolha das roupas, excetuando-se nos estados do sul do país. Sabe-se, ainda, que as roupas tem um apelo sazonal ideológico muito forte, regido pelas estações do ano, através dos lançamentos de moda – coleções outono-inverno, primavera-verão, alto verão, etc. (Rocha e Ramos, 1999). Portanto, a proteção demandada pelo consumidor brasileiro é regida muito mais por fatores intangíveis ou subjetivos, como por exemplo a proteção espiritual, que tangíveis ou objetivos, como a proteção contra o frio ou chuva.
Seguindo o modelo da hierarquia de Maslow, a necessidade de segurança seria a próxima análise. Estar a salvo de perigo físico, através da proteção do corpo, seria a função de segurança das roupas. Essa necessidade seria atingida com a adequação da escolha da roupa à atividade que se vai executar: uniformes, roupas para práticas esportivas, roupas de segurança, roupa de dormir, etc.
A necessidade seguinte, a social, cumpriria o papel de aproximar o indivíduo de grupos, fazendo-se reconhecer através do vestuário e tornando-o aceito e participante de determinadas sociedades. Neste sentido, o pudor tende a ocultar as excelências físicas que se possa ter, e geralmente impede o destaque de um indivíduo perante um grupo. O seu complementar, o despudor, tão presente na sociedade contemporânea e notadamente na brasileira, encontra nas roupas uma ferramenta ímpar de expressão.
A necessidade de estima, patamar seguinte do modelo em análise, é a própria contradição da necessidade anterior, pois representa a valorização do indivíduo pelo grupo ao qual está reconhecido, seja por respeito, liderança ou qualquer característica que promova o seu destaque dentro da sociedade. Explica-se aqui uma origem para os modismos e o poder de renovação das “tribos” através do fenômeno da moda.
A última necessidade descrita por Maslow (1987), a auto-realização, representa as potencialidades de cada indivíduo, tendo como referência si próprio. As roupas exclusivas e de luxo representam bem essa necessidade. O indivíduo consome porque se acha merecedor, e não para ostentar riqueza ou demonstrar poder, como nas necessidades analisadas anteriormente.
Referências:
MASLOW, A. H. (1987) Motivation and Personality. New York: Harper Collins Publishers.
ROCHA, Maria Alice V. & RAMOS, Francisco S. Planejamento de Produto para a Indústria do Vestuário Brasileira: uma abordagem segundo Maslow. Anais do XIX ENEGEP. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999.